O viajante ergueu furtivamente a cabeça.
A chuva havia amainado até tornar-se um fino chuvisco, mas o
vento frio persistia. Cinco homens, montados a cavalo, aproximavam-se
com um trotar quase desleixado. Dois deles carregavam lanças
rústicas, com cabos feitos de faia, bem afiados. Todos, exceto
um rapazinho louro e muito magro, tinham espadas embainhadas à
cintura. Vestiam-se ordinariamente, com gibões de couro gasto
e calças de algodão grosso. Apenas um deles vestia-se
com mais esmero, pois suas roupas eram pretas, tinham belos bordados
e pareciam novas. Uma bela capa preta amarrada sobre os ombros e um
pingente de prata pendurado ao pescoço completavam sua figura.
Parecia ser o que se pode chamar de líder do grupo e se
mantinha à frente. O rapazinho louro era o mais escorraçado,
por vestir-se apenas com uma túnica surrada e uma calça
que parecia ser feita de pano de saco. Também estava descalço.
Até seu cavalo aparentava ser o mais velho e maltratado. O
viajante não imaginou que poderia despertar o interesse
daqueles cavaleiros, mas eles o notaram ao longe, virando os cavalos
em sua direção.
Encontraram-se ao pé da
encosta. O viajante parou, enquanto os cavaleiros puxavam as rédeas
de suas montarias, mantendo-se à distância de uns dez ou
doze pés. O líder do bando olhava com um meio sorriso.
Para bandidos inexperientes, aquele homem coberto de andrajos
passaria por um mendigo. Mas o líder do bando sabia que
mendigos só viajam em grandes grupos e sempre costumam ficar
às voltas de cidades ricas. Já vira mais de uma vez
cambistas avarentos disfarçarem-se de miseráveis quando
desejavam viajar por aquelas regiões. E o homem permanecia
silencioso, talvez estivesse suplicando a misericórdia dos
deuses. Mesmo com a cabeça levemente erguida, era impossível
ver seu rosto.
Enquanto era examinado, o viajante
também estudou atentamente seus assaltantes. O líder do
bando parecia ser mais velho, talvez trinta e cinco ou quarenta anos.
Tinha olhos estreitos e cabelos grisalhos, com uma barba rala e nariz
fino, quebrado. Seus companheiros não eram tão dignos
de atenção. Pareciam-se com esses miseráveis
comuns que infestam reinos decadentes e roubam aqueles que forem
menos miseráveis que eles. Apenas o rapazinho atraiu o exame
do viajante, pois não tinha armas, exceto um longo arco, já
com uma flecha pronta para o disparo. Mas o olhar do garoto
denunciava outra coisa. Estava amedrontado, provavelmente era a sua
primeira incursão com o bando. Ótimo, um inimigo a
menos.
O líder quebrou o silêncio:
– O
que faz sozinho nestas terras malditas, companheiro? – perguntou,
de forma desinteressada.
O viajante ofereceu o silêncio
como resposta.
– Por
acaso você é mudo, estranho? – vociferou o líder
do bando – Estas terras são perigosas. Não há
rei pra guardar esse buraco de merda. Nós somos a segurança.
E você paga a gente se quiser passar.
Sombriamente, o estranho exibiu
com certa sutileza a lâmina da espada, que a capa ocultava,
como que alegando não precisar de proteção.
Diante do ultraje, o líder do bando ficou furioso. Não
lhe importava mais e aquele homem tinha ou não dinheiro. Iria
arrastá-lo pela lama.
– Então
não precisa de proteção! – Bradou o bandido,
sacando a espada.
O companheiro ao seu lado o
imitou, enquanto os outros dois, que carregavam lanças,
abaixaram-nas rumo ao estranho. Todos, exceto o tímido rapaz
louro, soltaram gritos de fúria. Estava para começar o
caminho real daquele misterioso viajante. Um caminho que, de
cinzento, seria tingido de vermelho.
Ir para Seridath - Parte I de II.
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Oi, Samuel, gostei da roupa com bordados, do piungente e da capa.Eu gosto de textos com esses detalhes. A história do viajante continua né?Abraço. Lourdinha Viana
ResponderExcluirGostei do final "Que de cinzento, seria tingido de vermelho" >.<
ResponderExcluirCê tem uma formações com as palavras bem interessantes, que nem aquela do conto do Névoa.