Na primeira noite após o
confronto, Seridath decidira isolar-se ainda mais dos demais
guerreiros da Companhia. Estava sentado nos limites do acampamento e
observava a escuridão entre as árvores. Seu capitão,
chamado Murrough, aproximou-se em silêncio, postando-se à
frente do rapaz. Num misto de vergonha e indignação, o
jovem não quis fitá-lo. Sem dizer palavra, Murrough
lançou uma espada aos pés de Seridath, afastando-se em
seguida. Era uma lâmina velha e quase cega, que talvez se
quebraria se fosse afiada novamente. Não era um presente de
primeira, mas com certeza seria suficiente para lidar com aqueles
camponeses mortos.
Ofendido,
o primeiro ímpeto de Seridath foi lançar longe aquela
espada. Mas afinal ponderou em seguida que talvez fosse melhor
mantê-la consigo. Não iria substituir a sua preciosa
Lorguth, mas talvez fosse útil em uma emergência.
E
aquele presente precisou ser utilizado logo no dia seguinte, no
segundo confronto. Com Lorguth amarrada às costas, Seridath
usou a velha espada muito bem, enfrentando e matando, como os demais,
os inimigos que encontrava. Mas a cada oponente que abatia, o rapaz
sentia-se mais angustiado por não poder empunhar a jóia
preciosa de sua alma, Lorguth.
Depois
daquela manhã sangrenta, em que a
Companhia teve seu primeiro confronto com os mortos-vivos, muitas
outras lutas ocorreram. Havia fazendas e inúmeros vilarejos
espalhados por toda aquela região, próximos a Arnoll,
mas o exército ora encontrava esses povoados desertos, ora
repletos de mortos para recepcioná-los. Com isso, o
destacamento envolvia-se em conflitos esparsos, embora sempre mais
camponeses contaminados surgissem para atacar os homens. Dentre a
infantaria, trinta feridos teriam se tornado zumbis, não
fosse pelos conhecimentos antigos de Urso Pardo e seus poderes de
cura. Com poções feitas de raízes de diversas
plantas medicinais, o andarilho conseguia recuperar os ferimentos,
mesmo aqueles infeccionados com a maldição. Se a vítima
ainda estivesse viva, era possível impedir que a doença
continuasse sua degradação. Ainda assim, os soldados
estavam cada vez mais desmotivados e o próprio andarilho
enfrentava dificuldades, pois o trabalho se mostrava excessivo para
aquele velho corpo. Não conseguiam vislumbrar um resultado
real, pois sempre havia mais bandos de seres sedentos de sangue para
lançar-se contra as lâminas da Companhia.
A cada zumbi destruído,
dois surgiam. Urso Pardo começava a temer que o norte de Dhar
já estivesse totalmente comprometido. Para piorar, como o
Conde e Senhor de Arnoll havia negado apoio à Companhia, o
velho andarilho não pôde seguir seus planos e teve que
deslocar suas forças com cautela redobrada, principalmente ao
montar acampamento no território amaldiçoado e
infestado de mortos.
Em Aldreth, as lutas estavam
causando uma profunda comoção. O rapaz sentia-se
transtornado, abalado com o que testemunhava. Aquelas pessoas, que
eles agora rechaçavam como se fossem monstros, tiveram uma
vida, sorriram, choraram, casaram-se e morreram. Mas agiam como
criaturas malignas, sanguinárias, e era preciso que fossem
eliminadas para não causarem o mesmo mal a outros. O jovem
arqueiro ouvia esse discurso continuamente, mas ainda era impossível
aceitar. Não conseguia tirar da cabeça a imagem de
crianças zumbis, correndo ensanguentadas na direção
deles, sua flecha penetrando entre os olhos de uma delas, o pequeno
corpo inerte estendido na campina. Essas
visões o sobressaltavam, pois vinham à sua mente com
uma nitidez surpreendente, como se ele tivesse acabado de vê-las.
Enquanto Aldreth sofria por sua
consciência, Seridath parecia mergulhar em frustração.
Era desprezado pelos companheiros e sua altivez habitual havia sido
substituída por um rosto cada vez mais sombrio e taciturno. Se
não estivessem envolvidos em constantes escaramuças, o
desprezo dos homens seria mais forte e talvez insuportável.
Mas o medo pelo dia seguinte e a ameaça que pairava sobre eles
tornava-os mais preocupados em manterem suas espadas erguidas e as
bordas dos escudos acima das orelhas.
Muito, muito, muito ... eu não sei como dizer isso com a veemência necessária... MUITO bom.
ResponderExcluirParabéns.
Puxa, MUITO OBRIGADO! Estou me esforçando e por isso, sempre que tiver uma crítica ou sugestão, pode falar! Abraços!
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