– Si-sim.
O jovem arqueiro desceu habilmente pelos galhos. Um vulto cruzou com
ele numa velocidade surpreendente. Assustado, olhou para cima a tempo
de ver Thin dar saltos enquanto subia pelos galhos, como se fosse um
esquilo. Aldreth alcançou o chão e desceu a encosta aos tropeções.
Correu rumo à pequena caverna. Enquanto aproximava-se, notas claras
de uma suave canção alcançaram seus ouvidos.
Chegando à fenda, deparou-se com Uri sentado em frente a Lucan que,
já desperto, tocava uma flauta de madeira. Ou melhor, quase fazia o
pequeno instrumento chorar. A melodia era tão bela e aconchegante,
que Aldreth entrou e sentou-se. Sentia-se confortável, uma
felicidade crescente tomando conta do seu peito. Não sabia quanto
tempo ficara a ouvir Lucan tocar seu instrumento, embora nem se
importasse com isso. A flauta o fazia lembrar de ribeiros
cristalinos, o sol incidindo em verdes folhas, o cheiro do pão
fresco da sua mãe...
– Mas o que é isso!? – bradou alguém atrás de Aldreth, na
entrada da fenda.
O rapaz deu um sobressalto, enquanto sentia com tristeza a música
desaparecer. Lucan tinha um olhar assustado. Seridath estava parado
na entrada da caverna, com seu olhar implacável. Thin estava um
pouco atrás, meio que se divertindo ao prever o que iria acontecer.
– Mandei que os chamasse, garoto! – vociferou o guerreiro. –
Não foi para ficar escutando música! E você, arauto, se pode tocar
uma flauta, também poderá empunhar uma espada! De pé!
– A culpa foi minha, senhor Seridath – replicou Lucan. – Uri
comentou que estava com fome e, como essa música faz esquecer muitos
males, pensei que o agradaria se escutasse um pouco.
– Música não enche barriga, seu pedaço de bosta! – replicou
Seridath, ainda furioso. – Essa tolice no mínimo irá denunciar
nosso esconderijo aos inimigos. Quero todos fora!
Os três levantaram-se. Aldreth ainda estava atordoado pelas palavras
duras. Aqueles olhos azuis, de gélida impiedade, sempre o
perturbavam, mas ele não estava conformado com a injustiça sofrida
pelo arauto. Aldreth queria que o bravo Uri falasse algo, já que o
anão parecera tão satisfeito enquanto ouvia a música. Lucan
mostrava dificuldades para se pôr de pé. Uri bateu levemente nas
costas do arauto, enquanto o ajudava a se levantar.
– Foi uma bela música, meu rapaz – resmungou o anão. – Até
esqueci a fome.
Seridath ouviu o comentário, mas manteve silêncio. Ele também
ficara um tempo ouvindo a melodia da flauta de Lucan antes de
interrompê-lo. E a música despertou nele imagens e sentimentos há
muito adormecidos. Olhos verdes, bondosos, o fitavam, adornados por
um rosto queimado de sol e cabelos castanhos, mas claros como o mel.
Uma mão quente o afagando. Sorrisos, verdadeiros diamantes de
alegria. Poesia de algum tempo perdido. E aquele caldo grosso que
matava sua fome, perto da lareira, enquanto a neve batia de leve na
janela.
O jovem balançou forte a cabeça, afastando aquelas lembranças,
enquanto subia a colina com os outros. Detestara aquela música.
Continua...
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