A
marcha prosseguiu, quase ininterrupta, durante os dois dias
seguintes. Os homens revezavam-se, descansando dentro das carroças
mais vazias. As paradas eram rápidas, duravam no máximo
dez minutos. Todos estavam em situação deplorável,
principalmente Balgata. O capitão já não usava
mais seu elmo e tinha o rosto abatido, com a barba por fazer e o
cabelo ruivo desgrenhado. Seridath era o único que se mantinha
quase impecável. Estava barbeado, bem disposto e quase não
fazia questão da ração distribuída entre
os homens. Durante a viagem ele e Aldreth não haviam trocado
palavra. Mas Seridath sentia-se em uma situação
confortável. Era respeitado por Balgata, talvez temido, e isso
o agradava. Mas havia outra questão importante para o rapaz.
Sentia-se mais disposto após ter matado aqueles argros. A
espada alimentava-se de sangue fresco, como Urso Pardo mesmo dissera.
Aos poucos aprendia algo novo sobre sua companheira.
Enquanto
o cavaleiro perdia-se em seu deleite, Balgata atravessava questões
muito mais sérias. Para ele, a coisa toda só estava
piorando a cada segundo. O ataque a Keraz, a fuga e agora a marcha
forçada. Sem falar nos feridos e doentes, que pareciam já
estarem nas últimas. O capitão hesitava em simplesmente
deixá-los para trás. Mas o que mais o preocupava era a
forma como os inimigos estavam atuando. Balgata pensava perplexo em
como os mortos-vivos haviam ficado "inteligentes" dentro de
pouco tempo, com organização militar apta a assaltar
uma cidade, a ponto de reduzi-la a escombros. Lembrou-se então
de uma reunião que ocorrera antes do início daquela
expedição. O Conselho de andarilhos os havia advertido
de que zumbis organizados indicavam a presença de um líder,
alguém de imenso poder que pudesse orientar os mortos-vivos
através de sua aura maligna. Balgata queria ter podido
confirmar essa suposição durante o interrogatório
do argo prisioneiro, que o maldito Seridath matara covardemente.
Ao
fim do terceiro dia, a caravana alcançou uma gruta escondida
no meio do bosque. O habitantes da região a chamavam de "Gruta
do Sapo", pela forma da entrada, que lembrava a boca escancarada
do anfíbio. Era um bom lugar para ser usado como esconderijo,
pois as árvores cerradas ocultavam a entrada e o interior
tinha espaço o suficiente para guardarem as carroças.
Cansados, os sobreviventes penetraram na gruta e foram se jogando ao
chão, como trapos puídos.
– Descansem,
aproveitem – advertiu Balgata –, pois logo cedo iremos seguir
viagem.
– Mas,
e os outros? - inquiriu um jovem aldeão. – Estarão
bem?
– Os
outros estão por contra própria. Estamos seguindo este
caminho com a esperança de terem sobrevivido. Não
adianta acumular preocupações com eles. Já temos
com o que nos preocupar.
Os
demais aldeões baixaram os olhos. Eram pessoas que perderam
seus parentes, mas que enviaram alguns deles nos outros grupos, com
esperança de que se salvassem. Mas agora a incerteza tomava
conta dos corações. Foram perseguidos, interceptados,
mas sobreviveram. Ainda assim, nada garantia que os outros dois
grupos não tivessem sido atacados. Um punhado de crianças
sem pais estavam com entre os temerosos sobreviventes, sem ninguém
para olhá-las. O desamparo dos idosos também era
visível. Os feridos já apresentavam os estágios
finais da contaminação. Alguns deles talvez morressem
ainda naquela madrugada.
E
foi realmente uma noite dura. Cinco homens ficaram de vigia na
entrada, enquanto outros cinco velavam os doentes. Logo que alguém
expirava, o corpo era silenciosamente carregado até o lado de
fora, onde era tratado de forma que não se levantasse mais.
Naquela noite, seis dos oito doentes foram sepultados dessa maneira.
Continua...
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