Há alguns dias terminei a leitura do romance Madame Bovary, de Gustave Flaubert. Em breve deixarei aqui uma resenha sobre esse livro. Gostaria, contudo, de comentar um trecho que me fez refletir por um bom tempo.
O livro fala de Ema Bovary e sua busca incessante por um significado para além do cotidiano, uma perseguição do ideal de paixão e felicidade. Nessa busca, Ema se envolve com amantes, estabelecendo um clima de tensão que vai ficando cada vez mais forte ao longo da narrativa. O trecho que me fez refletir fala sobre a relação entre Ema e seu amante Léon:
"Não discutia as ideias dela e aceitava-lhe todos os gostos; ele era mais amante dela do que ela o era sua."
Cheguei ao final dessa frase com a indagação sobre tantos casais que vivem uma situação semelhante, ou pelo menos têm impressão dessa desigualdade de sentimentos.
A verdade é que não há justa medida para o amor. Não há sentimento que possa ser medido, ou mesmo definido. Amamos, simples assim. Tentamos mensurar esse sentimento pelas angústias que nascem de nossas expectativas. É impossível aceitar que o amor do outro seja insondável, imensurável. E isso nos incomoda na proporção inversa de nossa segurança.
Numa sociedade regida pela imagem, desde os ícones pop até os gráficos estatísticos, o ato de comparar é quase natural. As consequências ficam a cargo das pessoas comuns, incapazes de manter o ritmo dessa força inexorável e retroalimentada que atua como modelo social.
A insegurança é um problema, pois provoca comparações que geram ainda mais insegurança. É importante, porém, assumir que quanto mais envolvidos estivermos em um relacionamento, maior peso daremos a nossas comparações.
Mas esse mesmo excesso de envolvimento pode também provocar um enganoso excesso de confiança. Carlos Bovary, marido de Ema, era tão devoto à esposa que sequer imaginava ser possível qualquer traição. Não fosse a convenção social ela já o teria abandonado. Carlos vai ao cúmulo da ignorância, ao encontrar um antigo bilhete de um outro amante. Ao ler as palavras comprometedoras, ele declara: "Amavam-se platonicamente."
Talvez seja inevitável – até necessário – comparar. Ou de repente o melhor é jogar tudo para o alto, esquecer ou ignorar qualquer diferença (ou semelhança), deixar-se levar. Quem sabe um pouco dos dois. Não deixando, porém, que a segurança descambe para a insensibilidade. Ou que comparações, sempre subjetivas, estraguem algo que transcende qualquer comparação.
Belo texto!!
ResponderExcluirMas as coisas têm que fazer sentido. Qto mais abstrato, mais fluido, mais a gnt tenta trazer pro chão, pra terra.
ResponderExcluirPerae que a Clarice fala isso melhor que eu:
Mas tenho medo do que é novo e tenho medo de viver o que não entendo - quero sempre ter a garantia de pelo menos estar pensando que entendo, não sei me entregar à desorientação.
Clarice Lispector
"Eu te amo porque te amo.
ResponderExcluirAmor é estado de graça
e com amor não se paga."
Assim como Deus o amor é um conceito pessoal, improvável e imponderável. Assim como Deus, não acreditar que o amor (ou não acreditar que isso que cremos ser amor) não existe e não pode ser experimentado por outras pessoas aumenta a sensação de vazio existencial e tira grande parte dos significados que damos à realidade...
É justamente isso que eu quis dizer, Teixeira, quando falei sobre expectativas demasiadas. Ao mesmo tempo, como a Dora disse, é bom acreditarmos que estamos no controle da situação, mesmo que este não exista.
ResponderExcluirPor isso, Dora, não entendi o "Mas", pois não defendi em nenhuma vez que o amor (ou seja lá o que sentimos) seja abstrato ou fluido.
O Amor é engraçado, pois não sabemos realmente quando é amor, ou quando é paixão. Eu acho que amei, muitas vezes de forma intensa, mas é justamente as comparações que fiz, que me tornaram insegura e que me faz perguntar até hoje se realmente amei. Então o que seria amor realmente? Na parte citada do Sr. Bovary, ele interpretou que foi um amor platônico o que ocorreu entre Ema e um antigo amante... Seria ele cego e insensível, incapaz de ter ciúmes? Ou seria amor o que ele sentia, que ele preferiu esquecer o passado da pessoa amada para evitar sofrimento entre ambos?
ResponderExcluirAcho que realmente não sei ainda o que seria tal sentimento, pois quando acho que amo, amo de forma intensa, dando espaço para todos os tipos de sentimentos... Depois de refletir sobre o que leu, o que seria realmente amor para ti, meu caro amigo?
Oxe, mas eu defendi! =) Eu acho que o sentimento é algo absurdamente subjetivo. Tenho certeza que de todas as vezes em que eu disse eu te amo, não foi nem perto de semelhança de quando ouvi. O amor não era o mesmo. Não era igual. Não tinha o mesmo tom, a mesma força. E como não há medidas oficiais para mensurá-lo. Então, como mencionei, partimos para as comparações, para o concreto. "vc me ama?" "sim", "vai ficar cmg pra sempre?" "vai ter filhos cmg" "vai fazer seus planos cmg" e porae vai. Não sei se me expliquei, na verdade, nao entendi bem a pergunta.
ResponderExcluirPq sou eu quem digo que qto mais abstrato mais a gnt tenta trazer pro concreto, decifrar, pra entender. Eu não disse que você colocou isso. Entende? Quis dizer que concordo com o seu texto, e acrescento. "as coisas têm que fazer sentido".
Bom, eu sou prolixa. Vê se dá para tirar entendimento dae. Bjo
Oi, Dora, compreendo agora. Na verdade, é bom discordar. Principalmente porque, a meu ver, torna-se um auxílio para que eu possa organizar melhor as ideias. Então, sinta-se à vontade que a casa é sua!
ResponderExcluirOi Tyr, o amor é realmente algo muito difícil. Não é à toa que muitos mataram e morreram por ele, mas também viveram e deixaram viver. Acho que acabei de falar algo extremamente melodramático...rs
ResponderExcluirSobre o Carlos Bovary, acho que é um pouco do que você disse, mas tem algo mais. O desfecho do livro acompanha bem de perto o marido da Ema, de forma a deixar dúvidas mínimas quanto às ideias dele. Possivelmente, semana que vem faço uma resenha do livro!
"Tudo indica que o terceiro vai ser incrível"... Nerito, esse é outro ponto forte da série, não é? A gente termina um livro tendo certeza de que o outro vai ser ainda melhor!!!!
ResponderExcluirÚNica coisa q eu faria diferente, seria dividir o volume 3 em dua partes pq segurar aquele livro enorme nas mãos vai fazer os braços formigarem!!!
E bem lembrado a oração da Arya toda noite... esqueci de comentar, mas é outro detalhe legal!!! Imagina a "guerreira" que ela vai se tornar quando crescer... essa menina vai ser o pesadelo de muitos cavaleiros!!!
COmecei ontem Marina... Nerito, o livro é sombrio hehehe... com certeza será muito bom!!!
Segundo George Steiner, "O processo comparativo é um instrumento inerente à racionalidade". Logo, acho que as comparações existem porque não conseguimos nos livrar da eterna racionalização do amor. Não conseguimos apenas sentir, precisamos racionalizar. Estamos fadados ao fracasso, sempre!
ResponderExcluirQue podre citar um teórico num comentário pessoal, mas acho que cabia e não resisti hehe
ResponderExcluirEi Nina, não liga. Muito bacana seu comentário. E se os teóricos não forem citados, como eles vão manter seus empregos? rsrsrs...
ResponderExcluirNina, concordo contigo. Aliás pode apagar o meu comentário e ficar só com o dela =p
ResponderExcluirbjo bjo.