Chegaram a Keraz no quinto dia
após o primeiro confronto. Era pelo meio da tarde, embora a
neblina tornasse a atmosfera mais sombria. Os homens estavam
extenuados pelos intensos combates e pelas precárias condições
de repouso. Keraz era um aglomerado de casas estabelecido no alto de
uma colina, onde os pescadores e fazendeiros das redondezas
costumavam fazer seus negócios. A aldeia era, portanto, mais
próspera e populosa que as demais. Todos temiam ver outra uma
cena brutal, e ficaram surpresos ao descobrirem que Keraz resistia.
Os próprios moradores cortaram grossos troncos de árvores
e os dispuseram, enfileirados, ao redor da aldeia. O resultado foi
uma sólida paliçada de uns quatro metros de altura. As
toras de madeira tinham pontas bem afiadas e ao redor da paliçada
um fosso razoável havia sido cavado, para completar as
defesas.
Logo que a Companhia aproximou-se,
o portão da paliçada foi aberto e alguns homens armados
de espadas, foices e forcados surgiram. Não eram guerreiros,
apenas simples camponeses, mas via-se, pelos seus rostos, mais alívio
do que desafio. De forma gradativa, mais gente foi surgindo do
portão. Todos tinham uma expressão de um desgaste que
beirava o desespero. Um exército desconhecido, justamente
naquele momento de crise, tornava ainda mais crítica a
situação daqueles camponeses. Mas ter um exército
à sua porta, com homens armados e bem equipados, soava-lhes
mais como uma ajuda de Rheena do que uma ameaça.
O prefeito da cidade pôs-se
à frente. Se aquele exército viera tomar Keraz, que o
fizesse, pois era melhor estarem nas mãos de inimigos de que
permanecerem à mercê dos mortos. Urso Pardo pareceu
entender a atitude do prefeito e, por isso, ordenou que o
destacamento parasse. Sozinho, o andarilho partiu ao encontro do
líder de Keraz, que aparentava ter por volta de cinqüenta,
talvez quase sessenta anos. Era alto, tinha uma avantajada barriga e
a barba bem aparada, que descia por seu queixo com uma ponta curiosa.
Após as devidas apresentações, Urso Pardo soube
que o prefeito se chamava Denor de Keraz e também era um
nobre, senhor de algumas terras naquela região e parente
afastado do Conde de Arnoll. À distância, Seridath
olhava com cobiça para as boas botas de couro que o homem
calçava.
Ao saberem o motivo que trouxera a
Companhia para o norte de Dhar, os moradores da aldeia acolheram os
guerreiros com verdadeiro júbilo. Keraz não era um
povoado pobre, mas não tinha construções de
pedra. Embora algumas das residências fossem espaçosas e
construídas com madeira de boa qualidade, a grande maioria
constituía-se em um conjunto de casebres ordinários e
com teto de palha. As construções mais ricas eram,
evidentemente, dos homens importantes da aldeia, como o sacerdote, o
juiz e o prefeito. A moradia do último era um casarão
esplêndido, construído sobre um sólido fundamento
rochoso, quase no centro da aldeia.
Foi para o casarão que Urso
Pardo e os três capitães da Companhia se dirigiram, para
uma conversa reservada com o prefeito, que estava acompanhado do juiz
e do sacerdote da aldeia. Os demais ficaram sabendo da conversa
quando Murrough e os os outros capitães retornaram.
O prefeito, muito solícito,
os convidara a descansar nos aposentos de hóspedes.
– Não há tempo para
confortos ou formalidades, bondoso senhor – replicou Urso Pardo, com
polidez –, pois o tempo urge. Temos enfrentado mortos durante os
últimos cinco dias e precisamos saber qual a situação
real desta região.
– Si... Sim, concordo - replicou,
surpreso, o senhor Denor –, embora eu insista que os senhores
devessem refazer-se da viagem primeiro.
– Estamos bem, caro senhor,
novamente o digo. Meus homens são os mais duros e lutam pelo
bem. Não se importarão de ouvir as cruciais informações
que vós tendes para fornecer-nos. Em breve, retornarão
às fileiras para reforçarem as defesas.
Ouvir que a Companhia estava
pronta para auxiliar nas defesas da cidade deixou o prefeito mais
tranquilo. Denor fez o convite para que Urso Pardo e seus auxiliares
se assentassem, para que ele pudesse relatar como nos últimos
dias Keraz havia mergulhado no mais profundo desespero.
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