Era um rapaz muito bonito. Seu cabelo crespo era bem curtinho, cortado à máquina. Sua pele negra tinha uma textura fascinante. Ele tinha uma voz ainda em transição, que variava do barítono ao tenor. Tinha um porte físico já proeminente. Um pouco baixo para a idade, reconheço. Mesmo com 15 anos, tinha a minha altura, embora eu fosse 3 anos mais novo.
Naquela noite, ele tinha uma confissão a fazer. Estava no baile em que o Capeta do Vilarinho apareceu.
Contou que todo mundo parou de dançar quando ele chegou. Ninguém desconfiava que era um ser sobrenatural, é claro, mas atraiu os olhares com sua presença marcante. Até a música parecia ter parado. Ele foi para o centro da pista e começou a dançar.
Ninguém dançou o break como ele. Alguns, mais ousados, arriscaram acompanhar, mas logo desistiram, diante das manobras que ele fazia. O povo tinha voltado a dançar, tentando se distrair, mas logo tiveram que parar, fascinados com o movimento.
Em instantes, a roda estava formada. Todo mundo batia palmas. Era uma festa maior que a festa. Parecia que agora o baile tinha realmente começado. Ele dançou de tudo o que tocava. Mulheres e homens o desejavam. Queriam ser como ele, ser dele.
Nisso, a música parou por uns segundos. Era meia-noite. O dançarino sem querer deixou o boné cair. Ele se abaixou para pegá-lo. Foi quando todo mundo, até quem estava bem longe, viu o par de chifres despontando na cabeça dele. Ergueu-se com um sorriso zombeteiro, dentes pontudos e olhos vermelhos.
Um estouro de fumaça e um fedor de enxofre. Correria, gritos, gente se empurrando. Ninguém queria ficar na quadra coberta, nem mesmo o DJ.
Meu amigo encerrou o relato dizendo que, na noite em que encontrou o Capeta do Vilarinho, decidiu virar evangélico.
Vinte e cinco anos depois de ouvir essa história, eu me pergunto por onde andará aquele rapaz bonito e reservado que, em um culto em minha casa, revelou ter sido testemunha ocular de uma das maiores lendas urbanas de Belo Horizonte.
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