Ouça a canção do vento é narrado em primeira pessoa e conta as peripécias de um jovem de 21 anos, estudante de Tóquio, durante um verão que ele passa na sua cidade natal. Em sua pegada pós-moderna, o livro não se preocupa com um enredo bem desenvolvido. Não há necessariamente uma linha narrativa. A premissa, escrita logo no segundo capítulo, é que a narrativa tenha durado 18 dias de um verão de 1970. Porém, como a própria vida, os capítulos parecem relatos desconexos, sem uma sequência clara entre eles. Cabe a nós, leitoras e leitores, criarmos o sentido que falta, costurarmos seus significados ocultos.
Algumas coisas são colocadas em sequência cronológica, mas nem tudo. Alguns capítulos poderiam, simplesmente, ser trocados de lugar. Outros, nem tanto. Os capítulos da rádio têm um significado alegórico secreto, para mim. Enfim, é um livro envolvente, com uma linguagem atraente que nos seduz e prende, do início ao fim.
O narrador, cujo nome nunca é mencionado, conta um pouco do seu passado. Faz um relato melancólico e saudoso, principalmente sobre as garotas que conheceu. O livro é curtinho, tem uma narrativa dinâmica. A premissa é simples, desprovida de mistério, embora algumas coisas fiquem no interdito.
Uma personagem nomeada é Rato, um rico e amargurado amigo do narrador-protagonista. Assim como ele, Rato bebe quantidades absurdas de cerveja. A principal fonte de sua amargura é justamente sua riqueza.
Outra pessoa mencionada é Derek Hartfield, um romancista fracassado e suicida. De Hartfield o narrador retira lições sobre escrever romances, embora essas lições não sejam lá tão confiáveis, por não terem garantido seu sucesso. Além disso, o próprio narrador ignora tais lições.
Outro ponto interessante é que o narrador está sempre lendo algum livro. De preferência de autoria de pessoas já mortas. Isso porque, segundo ele, pode-se perdoar o que essa pessoa tenha feito. Não concordei tanto assim com essa afirmação.
Com uma linguagem direta e ligeira, numa abordagem de estilo moderno e levemente melancólico, Ouça a canção do vento é uma novela sobre amadurecimento e a saudade de tudo o que já foi.
Pinball, 1973 é uma suposta continuação da novela anterior. Trata-se de uma narrativa tranquila, sem grandes percalços. Nela, o narrador se divide em contar suas experiências como tradutor, seu namoro com duas gêmeas e seu fanatismo pela máquina de pinball Spaceship, além de relatar as angústias existenciais do Rato, personagem da novela anterior.
O livro tem enredo simples como seu antecessor e, como este, é meio que um anti-enredo. O mais importante de uma história é quão bem ela é contada. Assim, a novela é cheia de descrições poéticas e imagens interessantes, assim como sua predecessora.
O narrador não passa por grandes transformações. Sua obsessão pela máquina de pinball e por Kant pode ser uma alegoria à perseguição obsessiva do artista pelo objeto artístico. Ao mesmo tempo, é uma narrativa também sobre amadurecimento e transformação, por mais contraditório que isso possa parecer. Afinal, quem se transforma não é o narrador, mas seu amigo, o Rato.
É interessante e curioso que em Pinball, 1973 não há qualquer menção das pretensões de Rato em escrever romances, algo que foi destacado com certa importância em Ouça a canção do vento. Contudo, isso é sumariamente ignorado. E afinal, os narradores das duas novelas seriam de fato a mesma pessoa? O próprio Rato seria o mesmo?
Existem coisas que me incomodaram em ambas as novelas. A posição das mulheres como objetos meramente sexuais foi uma dessas coisas. E seja nas pessoas das gêmeas, ou na mulher que se relaciona com o Rato, elas carecem de profundidade. É como se elas fossem figuras genéricas e surgem apenas como elemento pitoresco da narrativa, como figuras caricaturais.
Apesar disso, foi uma novela envolvente, com elementos visuais muito belos. Com esses trechos de descrições poéticas, Pinball, 1973 é uma narrativa esteticamente bela, dotada de um certo vazio, como uma flor artificial.
Assim foi o meu percurso pelas duas novelas que compõem a origem de Haruki Murakami como escritor.
Ficha Técnica
Ouça a Canção do Vento &Pinball, 1973
Haruki Murakami
ISBN-13: 9788556520296
ISBN-10: 8556520294
Ano: 2016
Páginas: 272
Idioma: português
Editora: Alfaguara
Perfil do livro no Skoob: https://www.skoob.com.br/ouca-a-cancao-do-vento--pinball-1973-620249ed620931.html
Bom dia:- Acredito que seja um livro maravilhoso de ler
ResponderExcluir.
Saudações cordiais. Uma semana feliz.
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Pensamentos e devaneios poéticos
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Olá Samuel!
ResponderExcluirGostei de saber sobre as obras de Murakami. Já vi que ele desde o início nos transporta para um universo de reflexões profundas. Li o que escreveste e saí curioso por explorar mais do autor. Obrigado pela recomendação! 🤗
Parece ser um livro fabuloso e incrível! Quero muito lê-lo!
ResponderExcluirBoa semana!
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Até mais, Emerson Garcia
Oi, Sam!
ResponderExcluirTudo bem?
Pela apreciação que fizeste da publicação conjunta das duas primeiras obras do escritor Japonês Murakami, julgo ser um livro com interesse, aliás tu próprio o afirmas, embora aqui ou ali, encontres algo menos bom.
Envolvente e com linguagem atrativa só pode interessar ao leitor.
Para além da tua descrição, estive escutando um vídeo, onde uma moça, garota como vocês dizem, nos explica como ele começou a escrever e como o fez.
Não conheço nem o nome do autor, mas fiquei interessada em saber mais.
Beijos e dias bonitos, com belo odor.
Parece ser bastante interessante!
ResponderExcluirObrigada pela partilha!
Bjxxx
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Sua resenha me empolgou, migo, fiquei curiosa. Adoro essa vibe pós-moderna e como ele desafia a gente a criar nossos próprios significados nessa narrativa meio doidinha. A vida é assim, né? Às vezes, a gente que tem que juntar os pontinhos!
ResponderExcluirAh, e essa ideia da obsessão pela máquina de pinball como uma alegoria à busca do artista pelo objeto artístico é sensacional! Adorei a sua análise.
Oi!
ResponderExcluirNunca li nada do autor, mas vi que esse ano a Alfaguara publicou uns títulos dele e fiquei curiosa para ver se o trabalho dele funciona comigo.
https://deiumjeito.blogspot.com/